29/11/2011

galeria entrevista Inês Nogueira

Terça-feira é dia de entrevista na galeria portuguesa.
Saiba um pouco mais sobre a Inês Nogueira.


A Inês é designer de formação mas atualmente a sua vida gira à volta dos tecidos. Vende alcofas de bebé e de bonecas, mantas, lençóis, etc. através da marca PACOTE criada por si em 2008. É também a autora do blogue CADERNO BRANCO onde, regularmente, escreve sobre trabalhos manuais e pequenos prazeres do quotidiano.
Tem duas filhas de quatro e sete anos e vive em Lisboa.

cadernobranco.wordpress.com
pacoteshop.wordpress.com

No seu blogue afirma que é de Lisboa e vive em Lisboa. Lisboa tem um encanto especial para si?
R: Gosto muito de cidades e tenho a sorte de já ter estado em várias delas fascinantes. Quando penso em viagens os destinos que mais me atraem são sempre as cidades. Lisboa tem um encanto especial, claro que sim, porque é o sítio que conheço melhor no mundo e porque é uma cidade única. Fala-se sempre da luz de Lisboa e é mesmo verdade que é uma luz especial.
Nos últimos anos têm acontecido muitas coisas boas em Lisboa: tornou-se, como nunca, uma cidade cosmopolita e muito mais virada para a rua – os jardins públicos enchem-se de gente, há quem ande de bicicleta e o rio está muito mais presente na vida das pessoas do que quando eu era pequena. Lembro-me de ouvir os adultos queixarem-se de que a cidade vivia de costas para o Tejo. Isso já não é assim.
Também há coisas muito más a acontecer: a Baixa está a morrer porque ninguém lá vive, há cada vez mais condomínios fechados – a ideia de se querer viver numa redoma, sem contacto com aqueles que são diferentes de nós, é uma coisa que me arrepia.
Para mim a coisa mais importante na escolha de uma casa é o sítio. Eu já mudei umas 14 vezes de casa, sempre no centro de Lisboa e em casas antigas. Aquele fascínio de muitas pessoas por casas "prontas a estrear" não me diz absolutamente nada. Eu gosto mesmo é de casas velhas em ruas velhas na parte velha da cidade. Agora vivo em Campo de Ourique e gosto porque é um bairro muito simpático, cheio de vida e com uma enorme mistura de pessoas, mas de alguma forma sinto-me um bocadinho deslocada do meu sítio. No que diz respeito à cidade, os anos em que vivi no Bairro Alto e ao lado do Príncipe Real foram aqueles em que me senti mais em casa.
Eu presto muita atenção aos pormenores e, por isso, quanto mais animado, variado e com coisas a acontecer um sítio é, mais ele me inspira e diverte. Não me imagino a viver no campo. Talvez um dia isso mude.


É designer de formação mas deixou de exercer. Porquê?
R: Trabalhei no departamento de design de uma grande agência de publicidade, depois passei uns tempos num atelier mais pequeno e a seguir estive em part-time numa empresa pública. Quando a minha filha mais velha nasceu eu já me tinha tornado freelancer e, como optámos por tê-la em casa até quase aos dois anos, eu acabei por dedicar esse tempo muito mais a ser mãe do que a investir na minha profissão. Nunca deixei de trabalhar em design, mas a quantidade de projectos foi diminuindo e, como aos poucos a costura foi tendo um lugar preponderante na minha vida, fui gradualmente substituindo uma coisa pela outra. Quando criei o meu blog isso tornou-se mais definitivo porque comecei a ter o entusiasmo de muitas pessoas a apoiarem-me e isso foi emocionante. E a verdade é que a minha paixão pelo design foi substituída pela paixão pela costura e pelos tecidos.


Como e quando apareceram os tecidos?
R: Os tecidos sempre fizeram parte da minha vida. A minha mãe sempre teve a casa cheia de caixas de tecidos, cestos de lãs, gavetas cheias de botões antigos e várias máquinas de costura. Todas as semanas ia lá a casa a D. Margarida, uma costureira que também trabalhava em casa da minha avó, que passava um dia inteiro a costurar para a família toda. A minha mãe tem uma retroseira escondida dentro dela, a verdade é essa. Provavelmente por isso eu cresci a saber que há sempre a possibilidade de fazermos o que quisermos com as mãos, a vontade e uma máquina de costura. Nem sei como ou quando aprendi a coser à máquina. Há pouco tempo descobri, com enorme surpresa, que não foi a minha mãe que me ensinou, porque ela própria não o sabe fazer. Sempre achei que sabia. Portanto, ou aprendi com a D. Margarida ou com a minha avó ou sozinha. Acho que o mais provável é ter sido sozinha, vendo e experimentando.
Houve um marco importante na minha relação com os tecidos que foi o nascimento da minha primeira filha. Porque até aí a costura tinha tanto peso na minha vida como muitas outras actividades manuais. Desde os cinco ou seis anos que faço tricot, em adolescente fiz e vendi cadernos feitos à mão, fiz doces para restaurantes e para a mercearia ao lado de minha casa, fiz ilustrações para uma revista, máscaras de carnaval para as várias crianças da família e dos amigos... Olhando para trás vejo que sempre fui uma fazedora e isso sempre foi muito valorizado pela minha família.

E a fotografia?
R: Passei grande parte da adolescência decidida a ser fotógrafa. Escolhi essa área na António Arroio e depois fui para o AR.CO. Passei muitas horas enfiada em câmaras escuras e cheguei a ter um laboratório montado no meu quarto. Tive a sorte de apanhar o departamento de fotografia da António Arroio numa altura em que tinha havido um grande investimento em material fotográfico. Os alunos que não tivessem máquina fotográfica podiam pedir uma emprestada, por exemplo. E tinhamos à disposição os rolos de filme e o papel fotográfico de que precisássemos para trabalhar. Só mais tarde, quando fui estudar para o IADE — onde se pagavam propinas altíssimas e mesmo assim tinha de se pagar qualquer fotocópia que fosse precisa — é que tomei consciência do luxo que era ter estado numa escola pública com tão boas condições de trabalho.
Quando comecei a estudar design, e durante os primeiros anos em que trabalhei como designer, apaixonei-me totalmente pelo meu trabalho. E a fotografia foi posta de lado. Passei anos sem pegar numa máquina, até ser mãe. Aí, pela vontade de registar a infância da minha filha e com a facilidade das máquinas digitais, voltei a encantar-me pela fotografia. Com o blog passei a querer fotografar tudo o que me rodeia e que me interessa. Hoje em dia sair de casa e esquecer-me de levar a máquina tornou-se uma tortura. Fico sempre com medo de não poder registar alguma coisa que encontre pelo caminho.


O seu blogue transmite muita serenidade e calma. A Inês é mesmo assim?
R: Muitas pessoas me perguntam o mesmo. Penso que sou assim e também sou o oposto. Há quem me ache muito tranquila e quem me ache um furacão. A maternidade deu-me uma certa inquietação que eu não tinha. Não sei analisar muito bem isto mas o facto de ser mãe criou-me um estado de alerta permanente que não me deixa estar completamente sossegada nunca. Por outro lado sempre tive uma enorme necessidade de criar harmonia à minha volta. De qualquer forma, em relação ao blog, ele não me mostra na totalidade nem à minha vida toda, mas é completamente pessoal. Tudo o que lá está é real e sou eu. Falta o resto — os dias confusos e cansativos, as dúvidas e o mau humor, como acontece com toda a gente. Simplesmente na altura de escrever não é sobre isso que me apetece falar porque não o acho muito interessante e porque me apetece mais pensar em coisas boas.

Organiza os seus dias ou trabalha por instinto?
R: Tento organizar mas trabalho muito mais por instinto. Estou sempre a querer melhorar isso porque muitas vezes me disperso, tal é a quantidade de coisas que me interessam e em que me envolvo. Quando for grande hei-de conseguir.

Tem projetos para um futuro próximo?
R: Tenho vários projectos encaminhados e umas mil e quinhentas ideias sempre a borbulhar na cabeça.

Para além dos tecidos, o que mais gosta de fazer?
R: Fotografar, ler, mudar o sítio dos móveis, cozinhar, fazer surpresas às minhas filhas, dar presentes, mudar de casa, ver séries a comer gelado, fazer listas disto e daquilo, ler jornais, procurar livros velhos em alfarrabistas, viajar, viajar, viajar, ...


É fácil conjugar a sua profissão com a maternidade?
R: Não é fácil mas, felizmente, é possível. Trabalhar em casa tem vantagens e desvantagens, como tudo. Por um lado é muito bom porque está tudo perto e posso saltar do trabalho para os assuntos domésticos num minuto. Por outro lado é difícil porque rapidamente dou por mim a fazer dez coisas ao mesmo tempo e a não conseguir concentrar-me como queria numa coisa só. Mas no geral acho que tenho muita sorte por poder gerir o meu tempo como acho melhor. Passo muitas noites a trabalhar quando a casa está mais sossegada e isso seria muito mais complicado se trabalhasse noutro sítio.

Sugira alguém português que, para si, seja inspirador.
R: A resposta óbvia é a Rosa Pomar. Admiro imenso o trabalho da Rosa e acho que ela tem inspirado muitas pessoas com a forma tão pessoal quanto altamente profissional como tem gerido o seu percurso. Também gosto muito do trabalho da Rita Cordeiro e da sua marca Wooler, dos bonecos Matilde Beldroega, da cerâmica da Paula Valentim, da loja on-line Noussnouss que é um deleite para os olhos, da A Vida Portuguesa e dos Quiosques de Refresco da Catarina Portas, dos livros da Planeta Tangerina, do trabalho gráfico do Jorge Silva... é difícil parar. Felizmente há muitas pessoas inspiradoras. Concentremo-nos nelas :)

3 comentários:

  1. Mais um belo registo sobre (da) Inês Nogueira.

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  2. Filhota,

    adorei as tuas respostas; aprendi coisas sobre ti e guardo comigo as que desde sempre conheço.
    Beijinhos e mais uma vez PARABÉNS.

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